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VISITA AO CENTRO ISLÂMICO DE CAMPINAS – Aladdin sem a lâmpada

Por - 3 de dezembro de 2015

O famoso desenho da Disney “Aladdin”, de 1992, começa com um homem em seu camelo no meio do deserto sob a canção que em determinada parte diz: “Venho de um lugar onde sempre se vê/Uma caravana passar/ É uma imensidão, um calor e exaustão/Como é bárbaro o nosso lar.”

Em outro momento, o protagonista do desenho, Aladdin, surge com seu fiel amigo, o simpático macaquinho Abu, pulando e cantando sobre os telhados da cidade de Agrabah: “Tenho que correr e ser ligeiro/ Pular/ Pra me livrar/ Eu roubo porque não posso comprar/ E é isso aí!/ Correr que aí vem o guarda/Tudo isso por um pão/ Por isso/Dizem que sou ladrão…”

Essas estrofes retratam um Oriente Médio hostil, bárbaro e atrasado, com habitantes miseráveis que roubam para sobreviver. Infelizmente essas generalizações nos guiam por caminhos perigosos que podem nos levar ao preconceito, à intolerância e a uma visão deturpada da realidade, hoje amplamente reforçada pelos meios de comunicação.

Para tentar mostrar outra realidade, ou ao menos uma que seja genuína, pois sem intermediários, na tarde do dia 04/11/2015, os alunos do Grupo de Estudos em Atualidades em companhia dos professores Victor e Marcos Rogério, da Pastoral do Liceu e de alguns pais, visitaram o Centro Islâmico de Campinas. Além de proporcionar uma oportunidade de contato com outro local de culto, de conhecer seguidores da religião islâmica e seus costumes, a proposta principal era a de ter uma conversa com três refugiados sírios que vivem no Brasil e que gentilmente atenderam nosso convite para esse encontro. Eles eram Mohammed, Aladdin e Rouda, mãe de Mohammed e tia de Aladdin, todos vindos de Damasco, capital da Síria.

Antes da conversa com os refugiados, todos entraram na Mesquita, seguindo as normas do local, como retirar os sapatos antes de pisar sobre os tapetes que cobrem todo o chão do lugar e, no caso das meninas, colocar o lenço sobre os cabelos. Os rapazes ficaram na parte de baixo e as garotas na parte superior da Mesquita, como é costume separar homens e mulheres durante as orações.

Em seguida todos ouviram algumas explicações feitas por Nader, presidente da Mesquita, sobre os costumes e ritos islâmicos, sobre a religião, sobre os muçulmanos e um pouco de história, mostrando aos alunos que há mais elementos que nos aproximam do que nos separam e que o conhecimento daquilo que nos é diferente nos ensina a conviver em paz e a respeitar o próximo, algo que toda religião prega.

Ao fim dessa conversa, todos se dirigiam ao salão do Centro Islâmico para o encontro com os refugiados, que moram em Hortolândia e estão no Brasil há aproximadamente um ano. Por ainda não terem o pleno domínio do português, Nader nos ajudou com as traduções.

Rouda, a mais tímida e com maior dificuldade com o idioma local apenas observou a conversa que se concentrou nos rapazes. A surpresa inicial foi a alegria com que nos receberam, sempre demonstrando otimismo e até mesmo fazendo piadas com algumas situações especialmente quanto à dificuldade com o português.

Eles responderam todas as perguntas, que variavam desde como era a vida antes do conflito, o que faziam na Síria, o que deixaram para trás, a vinda ao Brasil com outras quatro pessoas da família assim como as dificuldades encontradas desde que chegaram, as perspectivas de futuro, as ações dos EUA e da Rússia quanto ao conflito, as dificuldades políticas inerentes ao seu país, do qual se enchem de carinho para falar ressaltando a sua grande diversidade cultural, e os extremistas do Estado Islâmico. Com relação a esse grupo, fizeram questão de frisar que ele não representa os muçulmanos e muito menos o Islam. Para eles é apenas mais um grupo que “sequestrou” a religião em nome de interesses políticos. Um exemplo disso é que aqueles que mais sofrem com o avanço desse grupo extremista são os próprios muçulmanos que ou não aceitam sua ideologia ou simplesmente por serem de linhagens religiosas distintas.

Ao final da conversa, a triste revelação: no domingo, dia 08/11/2015, estão de partida.  A crise econômica do país, se ruim para brasileiros, é ainda pior para eles, que sem emprego e sem apoio do Estado, não conseguem uma vida digna no Brasil. Vão para a Turquia para em seguida seguir de barco pelo Mediterrâneo até a Europa, engrossando as filas desesperadas dos que tentam uma vida melhor. Sonham com a Suécia, Suíça ou Alemanha. Mas têm plena consciência dos riscos que os esperam e confessam o medo de que ao final dessa odisseia nada idílica, nem todos poderão estar juntos. O mar pode reivindicar sua parte.

Ao final, eles agradeceram pelo carinho com que foram recebidos pelos brasileiros e guardaram fotos em seus celulares como recordação desse encontro. Recordação que não pudemos registrar em fotos com eles por motivos de segurança. Mas com certeza nossas memórias jamais se esquecerão dessas histórias de vida que têm um nome, um rosto e uma fé.

Voltando à música do desenho e pensando na questão dos refugiados de hoje, as palavras “correr, pular para me livrar, bárbaro o nosso lar” ainda fazem algum sentido.

Se nosso amigo Aladdin tivesse uma lâmpada mágica como nos desenhos, creio que não precisaria usar os três desejos. Bastaria um: voltar ao seu lar. Em paz. Insha’allah!

Confira aqui os depoimentos! 

Confira aqui as fotos!

 

Prof. Me. Victor Begeres Bisneto e Prof. Me. Marcos Rogério Soares

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